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Maior floresta tropical da Terra, alojada no sistema fluvial mais extenso, de maior massa líquida do planeta e contendo uma em cada dez espécies globais, a Amazônia é partilhada por nove países. Mas é no Brasil, que as altas taxas de desmatamento e a intensidade dos incêndios florestais têm sido recebidos com preocupação por todo o mundo. Estão em jogo as vidas de quem vive com a floresta e algumas das questões mais importantes que afetam a vida humana na Terra atualmente: as alterações climáticas e a conservação dos ecossistemas essenciais para a nossa sobrevivência como espécie.

Os últimos cinco séculos na história da região amazônica apresentaram trajetória de perdas e danos, acelerada do século XX em diante. O incentivo à intensa ocupação da Amazônia promoveu o incremento nas taxas de desmatamento e de mudanças no uso da terra, alterando drasticamente o regime de fogo na região. Diferentes projetos geopolíticos e poderosos interesses econômicos sustentam a destruição da floresta mais rica do mundo. Até o início da década de 1970, o desmatamento da floresta era inferior a 1% do território amazônico, mas em 2019 atingiu cerca de 20% da região.

O desmatamento e a degradação da floresta amazônica se tornam cada vez mais complexos à medida que se dinamiza o mercado de terras, expande-se o acesso aos mercados consumidores e configuram-se novas geoestratégias de ocupação da fronteira agrícola. Pesquisas recentes investigam como a ameaça que paira sobre a Amazônia vai além dos que vivem na floresta. A Amazônia já está contribuindo para o aquecimento global, segundo análise realizada por mais de 30 cientistas. Estudos científicos mostram um impacto significativo na transmissão de malária causado pelo desmatamento em toda a Bacia Amazônica e problemas de saúde na população brasileira associados às queimadas. Os cientistas alertam que o desequilíbrio ambiental e a vulnerabilidade social da população fazem da Amazônia uma potencial incubadora da próxima pandemia e que a ruptura da integridade de seus ecossistemas reduz a capacidade de produção de alimentos, afetando a sobrevivência humana.

Nesta conjuntura, devemos estar muito atentos ao comportamento de gestores públicos diante de um problema socioambiental dessa envergadura. Os dois candidatos à Presidência da República no segundo turno falam em preservar os biomas brasileiros, principalmente a Amazônia, mas ambos já governaram o Brasil e sabemos o que cada um fez.

No governo do Presidente Lula da Silva (2003-2010) uma série de medidas pela proteção da Amazônia contra o desmatamento foram estabelecidas, culminando com a queda substancial de 25.300 km2 em 2003 para 6.451 km2 em 2010. As estratégias de aperfeiçoar os sistemas de monitoramento, criar áreas protegidas em torno de grandes projetos de infraestrutura e nas áreas sob a expansão do agronegócio, ampliar as operações de fiscalização e as medidas de restrição ao crédito para os desmatadores, foram fundamentais para esta redução.

Em sentido contrário, algumas decisões de gestão do presidente Jair Bolsonaro (2019-2022) enfraqueceram o controle ambiental. Observem o período de agosto de 2018 a julho de 2021, o desmatamento no bioma foi 56,6% maior que no mesmo período de agosto de 2015 a julho de 2018. A previsão dos especialistas é que em 2022 o desmatamento atinja 15.000 km2. Esse incremento exponencial e súbito não é fruto do acaso. Assistimos ao enfraquecimento da fiscalização e dos órgãos ambientais, a falta de punição a crimes ambientais, a redução considerável de ações de combate e controle do desmatamento e mudanças em várias leis, que evidenciam consequências desastrosas para a Amazônia e seu povo. Há uma crise institucional sem precedentes que leva a subordinação das iniciativas governamentais sobre a Amazônia aos interesses de quem promove e se beneficia com o desmatamento ilegal, atacando povos e comunidades que protegem a floresta.

Assim, pode-se observar que as trajetórias dos dois candidatos que disputam o segundo turno são contrastantes com relação às questões ambientais na Amazônia.

Do ponto de vista programático, o atual presidente considera a questão ambiental como impedimento à exploração das riquezas da região, aposta em atividades de alto impacto ambiental como principal motor do desenvolvimento e pretende continuar com as mesmas políticas que enfraqueceram a gestão ambiental. O candidato Lula da Silva, destaca em seu programa de governo a necessidade de reconstruir a política ambiental, fortalecer os institutos de ciência e tecnologia e os órgãos ambientais e indigenista, retirar os garimpeiros de Terras Indígenas e criar o Ministério dos Povos Originários.

Sábio, Papa Francisco nos alerta que “para cuidar da Amazônia, é bom conjugar a sabedoria ancestral com os conhecimentos técnicos contemporâneos, mas procurando sempre intervir no território de forma sustentável, preservando ao mesmo tempo o estilo de vida e os sistemas de valores dos habitantes”.

Caro leitor, olhe para a Amazônia antes de votar e pense quem cuida dela com olhos para o futuro.

Fonte: Liberal Amazon

Ima Vieira é agrônoma, com doutorado em Ecologia pela University of Stirling (UK). Estuda a ecologia da Floresta Amazônica. Pesquisadora titular e ex-diretora do Museu Goeldi. Conselheira da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência-SBPC.

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