Por Joaquim Alberto Andrade Silva[1]

“Felizes os que sonham, alimentarão a esperança de muitos e correrão o doce risco de um dia ver os sonhos realizados”.  (Dom Helder Câmara)

Diante de tantos sinais de morte e contradições existentes no planeta, no continente latino-americano, no Brasil, a esperança, a alegria, o cuidado para com as pessoas, com a vida parecem desaparecer, não existir. Cenários de dor, de tristeza cotidianamente fazem parte das vidas das pessoas.

Cenários de violência em todo canto, também na Região Pan-Amazônica, afetam diretamente a Casa Comum. Incêndios criminosos que se espalharam e ainda se espalham pela floresta. Vazamentos de petróleos, mineradoras, barragens e madeireiras que devastam árvores e poluem rios e terras. Agronegócio que espalha os diversos tipos de venenos pelo solo e pelo ar. Povos tradicionais, indígenas, quilombolas e ribeirinhos sendo expulsos de suas terras, mortos e criminalizados. Migrantes e refugiados sem a garantia do acolhimento. Cidades amazônicas com altos índices de violências, com ausência de mecanismos públicos que possam atender à população. Jovens encarcerados, sem emprego. Mulheres violentadas. Violações de direitos humanos e criminalização de lideranças locais. Governos omissos e coniventes com os “poderosos que dominam” a região, que matam, oprimem e violentam cotidianamente o povo.

Em meio a estes e tantos outros cenários e contextos existentes no território da Pan-Amazônia, é realizado desde o dia 6 de outubro, no Vaticano, o Sínodo Especial dos Bispos para a Região Pan-Amazônica. Com a presença do Papa Francisco, de centenas de cardeais e bispos de todo o território, assim como padres, diáconos, religiosas, religiosos, leigas, leigos e outros convidados como auditores e peritos da assembleia sinodal. O evento tem como tema aprofundar a Amazônia: novos caminhos para a Igreja e Ecologia Integral.

O momento tem sido de intenso diálogo para aprofundar os contextos existentes no território da pan-amazônia e que abarca o território de nove países, com conjunturas complexas e que, pela importância da Amazônia e de seus povos para com o planeta, merecem um olhar com atenção especial, da Igreja, do Estado, do mundo todo.

Depois de uma semana de Assembleia sinodal é possível afirmar que tem pairado muitos sinais de resistência, esperança e profecia. De muitos sonhos e possibilidades de ver a vida dos inúmeros povos pan-amazônicos ser transformada, com mais vida, justiça, dignidade, com seus direitos preservados e garantidos.

A RESISTÊNCIA se faz presente na fala de muitos homens e mulheres comprometidos com o território, com a causa dos pequenos, com os povos que sobrevivem a partir de suas lutas, dores e clamores. Resistência a partir do empenho em que novos caminhos sejam apresentados e trilhados pela Igreja na Pan-Amazônia. Resistência das milhares de vozes dos povos que participaram das escutas sinodais em todo o território pan-amazônico.

ESPERANÇA que emana da presença acolhedora, simples, humilde e alegre do Papa Francisco. Homem comprometido com a vida dos povos originários, com todos aqueles que sofrem. Tempo de esperançar, como nos inspira Paulo Freire, também pelas presenças e falas de lideranças indígenas, de mulheres, de pesquisadores e membros de outras instituições.

PROFECIA que denuncia e combate tantos sinais de morte. Profecia pelos rostos femininos nos espaços sinodais do Vaticano. Profecia que não vacila e se faz presente nas vozes que ecoam nos espaços do Sínodo. Profecia que faz a coragem, tão pedida pelo Papa, permanecer encarnada nas partilhas dos diversos agentes que tem feito o Sínodo acontecer. Profecia que tem dado o tom dos olhares repletos de cuidado e compromisso.

O Sínodo tem sido, desde sua convocação, perpassando a sua preparação e agora na sua realização, um profundo tempo de sinodalidade, de praticar o diálogo, a escuta, o caminhar junto, de conhecer o diferente, de “avançar para águas mais profundas” (Lc 5, 4), de denunciar e cuidar da vida que emana do povo amazônico. De um profundo desejo de uma atuação pastoral mais fortalecida e que esteja cada vez em comunhão com as realidades dos povos amazônicos.

Que os sonhos de novos caminhos em prol de um efetivo cuidado com a Casa Comum, por meio de uma ecologia integral, continuem sendo trilhados e concretizados, com a certeza de que “tudo está interligado” (LS 91), na constante utopia inspirada em Jesus Cristo, com esperança, resistência e profecia. Que Maria de Nazaré e Santa Dulce dos Pobres sigam nos acompanhando neste importante tempo kairológico para a Igreja e para toda a humanidade.

 

 

Referências:

Bíblia Sagrada. Brasília: Edições CNBB, 2016.

Papa Francisco. Laudato Si´ Louvado sejas: sobre o cuidado da casa comum. São Paulo: Paulus, 2015.

Paulo Freire. Pedagogia da esperança. São Paulo: Paz e Terra, 2014.

REPAM – Rede Eclesial PanAmazônica. Atlas Panamazônico. Aproximação da realidade eclesiástica e socioambiental. Contribuições ao Sínodo da Amazônia. 2019.

Sínodo dos Bispos. Assembleia Especial para a Região Pan-Amazônica. Amazônoa: novos caminhos para  Igreja e para uma ecologia integral. Instrumentum Laboris. Itália: Libreria Editrice Vaticana, 2019.

[1] Leigo, educador, participante como perito do Sínodo para a Pan-Amazônia. Especialista de Pastoralidade da União Brasileira de Educação Católica/UBEC, Brasília/DF.

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