Por Luis Miguel Modino, comunicação CNBB Norte1
A primeira Casa de Francisco e Clara na Amazônia foi inaugurada nesta quinta-feira 30 de novembro na comunidade São Mateus, no Bairro Zumbi dos Palmares, periferia de Manaus. Uma oportunidade para apresentar o livro “Realmar a Economia”, que contou com a presença do cardeal Leonardo Steiner, arcebispo de Manaus, e com um bom número de participantes da comunidade local, da Arquidiocese de Manaus, e da representante da Articulação Brasileira da Economia de Francisco e Clara, Gabriela Consolaro.
Uma Casa de Francisco e Clara no chão da Amazônia
Essa casa no chão da Amazônia era um sonho dessa articulação, segundo Consolaro, que a definiu como “uma experiência mística, profética, mas sobretudo popular e comunitária”, com protagonismo feminino, que mostra que “a Igreja é de fato povo de Deus que se movimenta, que se organiza, que pensa, que consegue refletir um sistema e consegue se movimentar para fazer outras realidades acontecerem, realidades inclusivas, plurais, acolhedoras, de trabalho comunitário, de mão na terra e sorriso no rosto”.
Com relação ao livro, ela que é uma das autoras, o vê como resultado de toda uma caminhada, com 30 autoras e autores que transitam por todos os temas existentes na Economia de Francisco e Clara, insistindo em que quer contribuir ao “chamado do Papa Francisco que nos convida a construir uma sociedade e uma Igreja realmente sinodal, ecológica, comprometida, com os pés que ficam neste chão”, mostrando alguns elementos presentes no livro, onde aparece um outro jeito de viver a vida. Gabriela Consolaro refletiu sobre o fato de ter adicionado Clara no Brasil ao movimento da Economia de Francisco, algo nem sempre compreendido e aceito fora do Brasil, mas que destaca a importância do feminino nessa realidade.
A economia só tem sentido ao serviço
Partindo do título do livro, o cardeal Steiner insistiu em que a alma que dá sentido, denunciando que “a Economia, ela está morta, porque a Economia, ela devia estar ao serviço das pessoas”. Segundo o arcebispo de Manaus, “a Economia não está mais ao serviço das pessoas, a Economia está explorando as pessoas, especialmente os pobres. A Economia não está mais ao serviço da casa de todos, está ao serviço de algumas pessoas que vão lucrando cada vez mais”. Um título que significa “dar à Economia de novo uma alma”, destacando que “a Economia só tem sentido quando está ao serviço, quando ajuda a criar fraternidade, quando ajuda a criar justiça, quando ajuda as pessoas a terem vida digna”.
O cardeal lembrou que na história houve tempos em que a Economia tinha alma porque estava ao serviço das pessoas. Ele pediu ajudar o Papa Francisco a buscarmos uma nova Economia, destacando o grande esforço realizado em um processo longo que faça com que possa entrar uma nova cultura, uma mudança diante do constante crescimento no mundo inteiro dos pobres, da fome, da migração por causa da fome, da violência. Segundo o arcebispo, ter acrescentado no Brasil o nome de Clara ajuda a entender o que significa a fraternidade e a preocupação pelo meio ambiente, uma dimensão de grande importância na Amazônia, onde a questão da economia tem a ver com a falta de cuidado pelo meio ambiente.
A periferia organizada transforma um sistema que mata
Um envolvimento nessas questões que está sendo promovido na Arquidiocese de Manaus, segundo Frei Paulo Xavier Ribeiro, coordenador da Comissão de Ecologia Integral, que leve a “colocar a ecologia integral dentro de todas as pastorais, dentro de todo o processo de evangelização”, algo que ele considera desafiador, mas que pode ser ajudado pela criação da Casa de Francisco e Clara para poder assumi-lo, destacando o papel fundamental da juventude nesse assumir. O frei vê necessário a incidência política, na medida em que “a política é uma forma de nos exercermos a caridade”, fazendo um chamado ao compromisso e entrar no caminho aberto pelo Papa Francisco com a Laudato Si´.
Nessa dinâmica, a Ir. Elis Santos, outra das autoras do livro, destacou a importância das periferias, apresentadas como contraponto, uma resistência, pois “a periferia organizada é capaz de transformar esse sistema que quer nos matar”, uma experiência vivida no Bairro Zumbi dos Palmares, onde o povo foi formando políticas públicas, comunidades eclesiais, que os fez ressurgir como periferia mobilizada. A religiosa insistiu na importância da valorização dos saberes da periferia, dos povos indígenas e tradicionais, saberes únicos que tem marcado a construção da Casa Amazônica de Francisco e Clara. Ela denunciou o apagamento da identidade indígena por um processo colonial violento, mas também fez ver que aos poucos foi se recuperando essa identidade.
Uma casa que é fruto de uma história, como foi relatado por diversas vozes, nascida do chamado do Papa Francisco em 2019, que no Brasil se concretizou nos passos dados pela Articulação Brasileira da Economia de Francisco e Clara, que acredita que é das periferias que vai brotar um mundo novo, e que nas casas de Francisco e Clara territorializa suas propostas, e que em Manaus tem envolvido mulheres e homens que enfrentaram um grande desafio.
Uma pequena semente plantada
Uma semente semeada em abundância, mesmo nem toda dando fruto, segundo o cardeal Steiner, fazendo um chamado a na Economia de Francisco e Clara perseverar na semeadura. Reconhecendo o muito sol, pedra, espinhos, pássaros, que não são todas as sementes que conseguem dar fruto, ele insistiu em que “nós queremos que na nossa semeadura a semente cresça e dê muito fruto”. O arcebispo disse que “uma nova economia é um processo longo, assim como foi um processo longo para chegarmos até hoje nesta verdadeira destruição que a economia está fazendo”, o que demanda perseverar na semeadura.
Dom Leonardo Steiner disse ser uma iniciativa pequena, igual a semente, fazendo um chamado a que “a gente persevere, acredite na força da semente, acredite que é possível uma nova economia, uma economia da fraternidade, uma economia onde todos tenham oportunidade, uma economia da solidariedade, uma economia da partilha”, pedindo a Deus “a graça de caminhar juntos e construirmos esse mundo novo tão necessário, que no Evangelho Jesus chama de Reino de Deus”, e que “não nos esqueçamos que todos nós estamos ao serviço do Reino de Deus”.