NotíciaFoto: Ana Paula, Assessora da Arquidiocese de Manaus (AM)

 

A tarde deste segundo dia (21) do V Encontro da Igreja Católica na Amazônia Legal foi dedicada ao diálogo sobre desdobramentos pós-sínodo que estão em curso, como o Rito Amazônico e a Ministerialidade. Na sessão mediada por Dom Benedito Araújo, bispo de Guajará-Mirim, contribuíram na reflexão o Pe. Agenor Brighenti e a Irmã Sônia Matos.

Um rito inserido na tradição da Igreja 

Pe. Agenor Brighenti iniciou sua fala fazendo memória da territorialidade da Pan-Amazônia e de que o desejo e o processo de configuração de uma Igreja com rosto amazônico vêm de longe. E, segundo ele, “de modo mais intencional e consciente, o esforço de uma configuração de uma Igreja com rosto amazônico, desde a primeira hora do processo de recepção do Vaticano II”, afirmou.

Brighenti recordou que o próprio encontro de Santarém, realizado em 1972, e a mensagem do papa Paulo VI ao evento quando dizia “Cristo aponta para a Amazônia”, já trazia sinais desse olhar especial para a Amazônia. “Hoje, no entanto, podemos dizer que o mundo olha para a Amazônia”, destacou.

A proposta de um Rito Amazônico vem do Sínodo para a Amazônia, realizado em 2019, pontuou Pe. Agenor. E, também com ela, o indicativo de que a Conferência Eclesial da Amazônia (CEAMA) deveria constituir uma comissão competente para elaborar um Rito Amazônico, conforme destacado no Documento Final do Sínodo: “O novo organismo da Igreja na Amazônia deve constituir uma comissão competente para estudar e dialogar, segundo os usos e costumes dos povos ancestrais, a elaboração de um rito amazônico que exprima o patrimônio litúrgico, teológico, disciplinar e espiritual da Amazônia, com especial referência ao que a Lumen Gentium afirma para as Igrejas Orientais (cf. LG 23)” (DF 119).

De acordo com o Padre Agendo, existem na Igreja Católica, além do Rito Latino, 23 ritos diferentes, que apontoam como um desejo de inculturação presente na tradição da Igreja. E destaca que “quando falamos de Rito Amazônico, falamos em mais do que um rito litúrgico, pois não se limita a inculturação de uma liturgia ao missal romano”. Segundo Brighenti, a proposta que vem sendo construída quer ser expressão da configuração de uma Igreja com rosto amazônico nos sacramentos e sacramentais, iniciação a vida cristã, liturgia das horas, ano litúrgico, ministérios, espaço litúrgico, estruturas e organização da Igreja.

“O Rito Amazônico configura um modelo de Igreja para a Amazônia”, destacou Pe. Agenor. Para ele o Papa Francisco abre as portas da Igreja na Amazônia para que, mo senho da grande tradição do Rito Latino, se desenvolva e cristalize um novo rito, o Rito Amazônico. Há mais de 1500 anos que não nasce um novo Rito na Igreja, e os existentes se remetem a era apostólica. “Um rito não se cria, mas se elabora a partir da prática já vivida no território. Nosso trabalho é recolher as práticas de inculturação”, destacou sobre o processo vivido pela equipe de elaboração do Rito Amazônico.

De acordo com o teólogo, na Amazônia há uma imensa diversidade de culturas e povos, o que é uma riqueza a ser respeitada e potencializada. Ao mesmo tempo, ele afirma que, mesmo em meio a toda a diversidade, por estarem em um mesmo bioma pode se falar em elementos de unidade. “E é precisamente a partir da identificação desse ‘denominador comum’ entre os povos e culturas da região Amazônica que se estabeleceu um ‘Marco Geral do Rito’, suficientemente específico para plasmar uma identidade amazônica, mas ao mesmo tempo suficientemente aberto para que cada Igreja possa integrar suas peculiaridade e singularidades”, afirmou.

Para o desenvolvimento do Rito Amazônico foi constituído um Grupo de Trabalho para coordenar todo o processo. Ele teve início em 2020 com perspectiva de se encerrar em 2028, contando com a instituição de comissões de trabalho e participação das Igrejas Locais. Como resultado do trabalho realizado até aqui destaca-se um texto de 90 páginas com referenciais da realidade amazônica para a elaboração do Marco Geral do Rito Amazônico. Posteriormente foi feita uma redação de um texto mais curto de 40 páginas com os referenciais identificados, para posterior socialização às Igrejas locais da região.

Segundo Pe. Agenor, o caminho agora é a constituição de comissões de trabalho para a elaboração dos rituais, com base no Marco Geral e nas experiências de inculturação coletadas na pesquisa de campo. Para o próximo ano, espera-se apresentar às Igrejas locais, CEAMA e Conferências Episcopais e posteriormente ao Papa Francisco e Dicastérios da Cúria Romana. Entre 2025 e 2028, a proposta é que o Rito Amazônico seja aplicado  de forma “experimental”, com avaliações e ajustes anuais. Finalmente, em 2028, seja submetido para apreciação e aprovação em Roma.

Foto: Ana Paula, Assessora da Arquidiocese de Manaus (AM)

Foto: Ana Paula, Assessora da Arquidiocese de Manaus (AM)

Ministerialidade e Sinodalidade Amazônica

Ir. Sônia Matos, religiosa da congregação das Irmãs do Preciosíssimo Sangue, partilhou um pouco da sua experiência vivida no regional Norte 1. Segundo ela, não se pode pensar nos ministérios somente como mediação pastoral, pois são mais do que isso. “Assim como não pode pensar em ministérios por causa da falta de ministros ordenados, seria desviá-los de seu significado e fundamento”, afirmou Ir. Sônia.

De acordo com a religiosa, é preciso partir do fundamento da identidade cristã que é alicerçada no sacerdócio comum, que deriva do batismo e se manifesta na sua dimensão testemunhal e missionária. Para tanto, ela aponta que os ministérios são trilhas para encarnar o Evangelho e a vivência do Reino. “Para uma Igreja com rosto Amazônico é necessário uma ministerialidade amazônida, através de vivência eclesial que siga a capilaridade, sinodalidade, dos rios”, destacou.

Sobre a ministerialidade feminina, a religiosa lembrou que ao longo dos séculos o Espírito Santo suscitou na Amazônia mulheres fortes, generosas, destemidas, missionárias que batizaram, catequizaram, ensinaram a rezar e mantiveram a Igreja de pé, exercendo, de fato, a diaconia na animação e coordenação das comunidades, sustentando-as, conservando-as e cuidando delas. “As mulheres são portadoras de uma palavra falada com autoridade, competente, pública, que contribui para a construção e o amadurecimento do corpo eclesial”, afirmou Ir. Sônia.

Para a religiosa, a diferença não está no que se faz, mas no que se é para a comunidade cristã. “Existe uma ministerialidade de fato, uma diaconia da mulher. O que se precisa é de um reconhecimento, da responsabilidade comum no exercício de ministérios leigos, que supera a discriminação de gênero”, enfatizou. “Com o reconhecimento, de fato e de direito, as mulheres sairiam do papel de suplência pastoral e de exclusão nas instâncias de decisão, para assumir um ministério a partir de sua dignidade batismal.

Conclusões do dia

Após as apresentações da mesa, os participantes do encontro puderam dialogar e trazer as ressonâncias suscitadas pelas falas. Logo em seguida, foi apresentada a síntese dos trabalhos dos grupos que foram apresentadas na plenária da manhã para que pudessem ser apreciadas, pois elas irão compor os compromissos a serem assumidos pelo conjunto das Igrejas particulares da Amazônia. Na sequência o grupo aprovou uma carta do encontro que será encaminhada para o Papa Francisco em nome de todos os participantes.

O V Encontro da Igreja Católica na Amazônia legal se encerra nessa quinta-feira (22), quando serão apresentados os compromissos assumidos pelo grupo.

Por: Paulo Martins, Comissão Episcopal para a Amazônia

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