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Estimados irmãos e irmãs, queridos membros da Rede Eclesial PanAmazônica – REPAM,

É com grande alegria e profundo reconhecimento que nos reunimos hoje para celebrar os 10 anos desta rede, um farol de esperança em meio a tempos desafiadores. Em uma década de atuação, a REPAM tornou-se um sinal profético na defesa da vida, dos territórios e dos povos amazônicos, sempre iluminada pelo Evangelho e pelos ensinamentos da Igreja. Podemos falar, sem dúvida da perspectiva do farol, lembrando das palavras de saudação que o Papa Francisco enviara naquele 12 de setembro de 2014: “que os agentes e entidades estejam comprometidos com a vida na Amazônia e que possam contribuir para “alargar os espaços da compreensão e da solidariedade entre os homens e os povos, refletindo constantemente aquela ‘Luz das nações’ – Cristo – que resplandece no rosto da Igreja universal e das Igrejas locais”.

Nestes anos, a REPAM assumiu um papel essencial e iluminador no da Casa Comum, especialmente da Amazônia, “pulmão do nosso planeta e local de imensa biodiversidade”, como nos recorda o Papa Francisco. O Papa nos ensina em sua Encíclica Laudato Sì que “tudo está interligado” (LS 16), e que não podemos separar a crise ambiental da crise social. É exatamente nesta interligação que a REPAM tem feito seu trabalho: unindo as vozes das comunidades, dos povos originários e da Igreja, para que, juntos, possamos ser defensores, guardiães da Criação.

Trata-se de uma verdadeira responsabilidade pela criação, de acordo com a qual, não promovemos somente a defesa da terra, da água, do ar, da fauna e da flora, mas há um dever de proteger as pessoas de uma degradação de sua dignidade e direitos. Quando a ecologia humana é respeitada dentro da sociedade, beneficia-se também a ecologia ambiental.

A REPAM tem indicado o caminho do desenvolvimento de um pacto entre ser humano e ambiente como chave para um mundo melhor e mais solidário. Para o Papa Francisco, o compromisso para superar problemas como fome e insegurança alimentar, persistente desconforto social e econômico, degradação do ecossistema e cultura do desperdício, requer-se uma renovação da visão ética que saiba colocar no centro as pessoas, com o objetivo de não deixar ninguém à margem da vida. “Uma visão que una em vez de dividir, que inclua ao invés de excluir” (Papa Francisco, discurso 8 de junho de 2019).

Lembremo-nos, mais uma vez, da sua saudação para o evento de setembro de 2014: “o Santo Padre saúda os mentores, participantes e aos que aderiram à iniciativa, que vem dar respostas ao importante desafio de viver juntos, misturar-nos, encontrar-nos, dar o braço, apoiar-nos, participar nesta maré um pouco caótica das redes e demais instrumentos da comunicação humana que pode transformar-se numa verdadeira experiência de fraternidade, numa caravana solidária, numa peregrinação sagrada.”

Na proposta de Rede, bem constituída e articulada, a REPAM abraça a todos, superando a visão de um projeto de poucos, ou de uma minoria esclarecida que se apropria de um sentimento coletivo e busca somente seus interesses. Ao reunir bispos, sacerdotes, missionários, religiosas e leigos, a partir da união e cooperação de diversas entidades, como o Departamento de Justiça e Solidariedade do Conselho Episcopal Latinoamericano (Celam), a Comissão Episcopal para a Amazônia da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), a Confederação Latino-americana de religiosos e religiosas (CLAR), a Secretaria da Caritas América Latina e Caribe e do Pontifício Conselho Justiça e Paz, firmava-se um acordo para viver juntos, um pacto social e cultural em vista de uma responsabilidade coletiva que pudesse garantir o bem comum neste instante histórico e viabilizasse às futuras gerações de receberem um mundo viável e digno para se viver e conviver.

“A ecologia integral é inseparável da noção de bem comum, princípio este que desempenha um papel central e unificador na ética social. É o conjunto das condições da vida social que permitem, tanto aos grupos como a cada membro, alcançar mais plena e facilmente a própria perfeição” (Laudato Sí, n.156).

Nosso tempo é marcado por desafios que colocam em risco a vida do planeta e de suas populações mais vulneráveis. A Amazônia, em particular, enfrenta uma crise sem precedentes: a devastação de suas florestas, a contaminação de suas águas e a violação dos direitos de seus povos, que, em última instância, representam a ameaça à vida de toda a humanidade. O Papa Francisco, no Sínodo para a Amazônia, disse com clareza: “A destruição da Amazônia não é apenas uma tragédia para o meio ambiente, mas para as próprias culturas e para a humanidade” (Querida Amazônia, n.14). A REPAM, nesses 10 anos, tem sido uma resposta viva a essa tragédia.

Ao promover a vida e o Bem Viver, a REPAM nos recorda que os povos da Amazônia não são apenas vítimas, mas protagonistas na luta pela justiça socioambiental. A preservação da vida, passa necessariamente pela dignidade humana. Os mesmos que exploram, manipulam e desprezam a vida humana serão os que vão explorar, manipular e desprezar o planeta e seus recursos, na nossa Casa Comum. É uma consequência lógica e nefasta: “O ambiente humano e o ambiente natural degradam-se em conjunto; e não podemos enfrentar adequadamente a degradação ambiental, se não prestarmos atenção
às causas que têm a ver com a degradação humana e social. De fato, a deterioração do meio ambiente e a da sociedade afetam de modo especial os mais frágeis do planeta” (Laudato Sí, n. 48).

A metodologia de articulação em rede que esta organização promove se alinha com a Doutrina Social da Igreja, que nos convida a ser servidores da dignidade humana e do bem comum. Na defesa dos direitos humanos, da biodiversidade e da justiça, vemos a concretização da missão da Igreja: ser “sal da terra e luz do mundo” (Mt 5,13-14).

A crise climática que enfrentamos hoje exige de todos nós uma profunda conversão ecológica. Como nos exorta o Santo Padre, “uma verdadeira abordagem ecológica sempre se torna uma abordagem social, que deve integrar a justiça nos debates sobre o ambiente” (Laudato Sì, n. 49). Entendemos que o caminho é uma ecologia integral que torne possível um sistema normativo que inclua limites invioláveis e assegure a proteção dos ecossistemas, antes que as novas formas de poder derivadas do paradigma tecno-econômico acabem por arrasá-los não só com a política, mas também com a liberdade e a justiça (Laudato Sí, n. 53). Esta é a missão da REPAM: articular uma resposta integral, promovendo a defesa da vida em todas as suas formas e sensibilizando a sociedade sobre a importância da Amazônia para o equilíbrio climático global.

Hoje, ao celebrarmos esses 10 anos de lutas e conquistas, renovamos nosso compromisso com a Casa Comum e com os povos da Amazônia. A CNBB, quer lembrar de todos os protagonistas, desde o 1º Encontro interregional dos Bispos da Amazônia, em Manaus, de 2 a 6 de julho de 1952, passando pelo apelo que Paulo VI, em 1971, fazia ecoar: “Cristo aponta para a Amazônia” e o histórico encontro de Santarém, em que homens e mulheres souberam ouvir a voz do Espírito Santo e entenderam os desafios que vinham pela frente. A espiritualidade encarnada que guia a REPAM nos convida a agir com coragem, compaixão e esperança, confiantes de que Deus está conosco nesta jornada.

Termino com as palavras de São João Paulo II, que nos inspiram a sermos vigilantes e incansáveis na defesa da vida: “A paz com Deus Criador é a paz com toda a criação” (Mensagem para o Dia Mundial da Paz, 1990). Que possamos, com a graça de Deus, continuar a construir este caminho de paz, justiça e cuidado, especialmente pelos povos e territórios da Amazônia. Parabéns à REPAM pelos seus 10 anos de serviço dedicado e profético. Que o Senhor continue a abençoar esta obra e nos dê a força para persistirmos nesta missão tão vital para a vida de toda a humanidade. Brasília, Pontifícias Obras Missionárias, 12 de setembro de 2024.

Dom Ricardo Hoepers
Bispo Auxiliar de Brasília
Secretário-Geral da CNBB

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