O baixo índice de progresso social e os indicadores de criminalidade e violência em toda a região amazônica evidenciam o avanço dos garimpos ilegais na Amazônia.
Alguns dos relatos da situação dramática dos Povos Yanomamis, que retratam bem essa realidade chegaram ainda em 2020, quando dois indígenas foram assassinados em um conflito próximo a uma pista clandestina que atende o garimpo. Homens aterrorizam a região transitando encapuzados, vestidos quase sempre de roupas pretas, circulando com pistolas e fuzis. Os garimpeiros representam ameaça, pois são luxuriosos e violentos, produzindo um clima de terror e angústia permanente nas comunidades.
As pessoas têm medo de sair para caçar, medo de cultivar roças mais distantes, medo de se locomover pelo rio, o que também impacta profundamente o sistema produtivo das famílias. As mortes violentas foram responsáveis por 35% dos óbitos nos últimos dez anos, segundo os dados do Sistema de Informações da Atenção à Saúde Indígena (SIASI), obtidos via Lei de Acesso à informação. A bebida alcoólica é outro importante elemento que deve ser considerado para compreender a atual situação de violência e abandono dos povos amazônicos.
A Irmã Cecília* vê essa situação bem de perto nos rios e afluentes da região do Rio Solimões.
“Os chamados pirata dos rios, que são os traficantes de drogas causam pânico nas comunidades, as pessoas não têm segurança de andarem de barco, voadeira ou rabeta sozinhos por conta dos assaltos e do controle dos territórios, é uma sensação de medo coletivo. Tudo isso se acarreta a grande falta de políticas públicas no âmbito da Segurança Pública e na fiscalização do garimpo ilegal, que junto com as articulações dos traficantes de drogas e de armas, controlam os territórios”, lembra.
Os jovens, entusiasmados com a possibilidade de terem acesso a um número maior de mercadorias e por falta de conhecimento dos impactos da atividade, acabam cedendo ao assédio dos garimpeiros e facilitam a aproximação das comunidades, sem que os demais membros das comunidades estejam de acordo ou mesmo tenham ciência desse arranjo. Os jovens que fazem esta intermediação são frequentemente presenteados com armas e assim passam a defender os interesses dos invasores contra o restante da comunidade que se opõe à atividade, conforme aponta o relatório Yanomami sob Ataque, produzido pela Hutukara Associação Yanomami com apoio do Instituto Socioambiental (ISA).
“Existe uma exploração sexual de meninas, mulheres e crianças rápida e isso é muito silenciado nas próprias comunidades, pois têm medo de denunciar a própria realidade. Por exemplo o trabalho escravo, muitos jovens são obrigados a trabalhar para os traficantes e não recebem nenhuma remuneração. É um desafio muito grande dos governos tanto em nível Federal como em nível Estadual e Municipal as políticas públicas externas para a questão da segurança”, destaca Irmã Cecília*.
Há evidências crescentes das relações indiretas entre os mercados de drogas e o desmatamento. Especificamente, o tráfico de drogas e a lavagem de dinheiro associada a setores extrativos locais estão ligados à perda de cobertura florestal. Apelidada de “narcodesmatamento”, essas atividades incluem o reinvestimento do produto do tráfico de drogas na aquisição de terras legais e ilegais, no desmatamento florestal, na criação de pastagens para o gado e outras atividades agrícolas, como plantações de soja e palmeiras. É o que aponta o Relatório Mundial de Drogas de 2023 da Organização das Nações Unidas.
O relatório da ONU conclui que abundância de recursos naturais na região tem sido explorada pela rede criminosa do tráfico. “A Bacia Amazônica é o lar de várias vastas fronteiras onde o crime relacionado às drogas, crime que afeta o meio ambiente e o crime convergente estão concentrados, beneficiando-se de uma aplicação da lei fraca, um rico ecossistema de atores criminosos e uma escassez de alternativas econômicas significativas”.
(*) Nome fictício para garantir o sigilo e a integridade da fonte.