Por CPT Nacional
Na quinta-feira (17), perdemos a líder quilombola Mãe Bernadete, executada dentro de um terreiro em Simões Filho, região Metropolitana de Salvador (BA). Maria Bernardete Pacífico era ialorixá, coordenadora nacional da Coordenação Nacional de Articulação de Quilombos (Conaq) e líder do Quilombo dos Palmares, importantes espaços de organização e resistência para a população quilombola.
Sofrendo ameaças há pelo menos dois meses, por grupos ligados à especulação imobiliária em Salvador, Bernadete é presença marcante na preservação da história de seu povo. Ela era mãe de Flávio Gabriel Pacífico dos Santos, o Binho do Quilombo, que foi assassinado em 2017, em Pitanga dos Palmares, crime que ainda segue impune. Ela também lutava incansavelmente por justiça em razão do assassinato do filho.
Episódios como esse devem ser severamente investigados, os responsáveis identificados e responsabilizados. Contudo, sem que haja atuação coordenada de enfrentamento à violência, esses crimes têm ocorrido em índices cada vez mais alarmantes. De acordo com dados do Fórum Brasileiro de Segurança Pública (2021), a desigualdade racial atinge diretamente a população negra, que são vítimas de 77% dos homicídios no País. Assim, a chance de uma pessoa negra ser assassinada, é 2,6 vezes maior do que a de uma pessoa branca.
O racismo estrutural entranhado em nossa sociedade, tanto nas esferas da vida pública, quanto privada, nos coloca diante de situações inadmissíveis, tais como a privação do acesso à terra e água para as comunidades quilombolas, a intolerância religiosa, o encarceramento em massa da juventude negra, e a violência contra as populações moradoras das favelas, a imensa maioria também afrodescendentes.
Nesse mesmo sentido, a Comissão Pastoral da Terra (CPT) vem alertando sobre o acirramento sistemático da violência contra quilombolas no campo brasileiro. Registros do Centro de Documentação Dom Tomás Balduíno (Cedoc-CPT) mostram que, de 2005 a 2023, 47 quilombolas foram assassinados em decorrência de conflitos no campo. O ano de 2017 foi o que apresentou maior número de vítimas, quando 12 pessoas foram executadas, dentre elas o próprio Binho do Quilombo.
Em 2023, Mãe Bernadete é a 16ª vítima de homicídio em contexto de conflito territorial no Brasil, a segunda quilombola assassinada neste ano. Dessas 16 ocorrências, 3 assassinatos ocorreram na Bahia, sendo duas pessoas indígenas e uma quilombola.
Lamentamos profundamente o ocorrido e nos colocamos em solidariedade e marcha junto ao povo negro do Brasil, historicamente vítima da injustiça, da intolerância e da tentativa de subalternização. Exigimos que esses crimes sejam averiguados e que seja feita justiça por Mãe Bernadete e Binho do Quilombo!
“[…]
Por causa de um mundo mais justo
Por causa de tanta opressão
Por causa de coisas que disse
Por ter defendido os irmãos
Mataram mais uma irmã
Mais ela ressuscitará e
O povo não esquecerá”
18 de agosto de 2023
Comissão Pastoral da Terra – Secretaria Nacional