Dom Pedro Brito Guimarães,
Arcebispo de Palmas – TO
Sou testemunha ocular de que o papa Francisco ama, com imenso amor, as mulheres. E quem não as ama? Ele, no entanto, as ama com um amor preferencial e diferenciado. Durante o Sínodo para a Amazônia, sempre assediado pelas 46 mulheres que dele participaram, sobretudo, nas horas das fotografias, disse, verbalmente: “o meu problema são as mulheres!” Este é o problema de todos nós, homens. “Problema” aqui é usado no sentido positivo e carinhoso e não pejorativamente. Se assim não fosse, a culpa recairia sempre sobre as mulheres. E não é bem assim. Quem dera se, de fato, os problemas do papa fossem as mulheres.
No referido Sínodo, as mulheres tiveram um papel inédito, na história passada e recente da Igreja. Nunca, como antes, se destacou com tanta propriedade e sem emotividade, o lugar delas na Igreja. Num mundo, como o nosso, cada vez mais desflorestado, as mulheres das florestas amazônicas reflorestaram e “amazonizaram” os espaços e os ambientes sagrados do Sínodo para a Amazônia.
O cenário do Sínodo mudou completamente com as presenças dessas mulheres. Elas trouxeram cores, vozes, cantos, vestimentas, alegria e vida aos ambientes e aos espaços sinodais. Suas vozes, suas vestes, suas cores e seus carismas ressoaram na Aula Sinodal como um unguento e um bálsamo, suavizando e perfumando os rostos, as vozes e as almas dos padres sinodais. Seus pedidos se fizeram ouvir. Uma auditora fez este pedido ao papa: “santo padre, vejo que aqui no Vaticano tem muitos padres. Mande-os para a Amazônia!”
Conviver com elas foi uma delícia; ouvi-las, ainda mais. Disse uma outra auditora: “o papa acredita na gente”. Na Igreja, a minha voz, como as vozes das mulheres não são tão fortes e nem também bem ouvidas como a voz do papa.
A própria palavra “Amazônia” – palavra feminina – dá nome ao imenso berço e santuário da vida. Amazônia tem nome de mulher. A Amazônia é a parábola do sonho eclesial do papa Francisco. As amazonas são fotografadas como mulheres guerreiras, com roupas longas, coloridas e vistosas, montadas em seus cavalos, com aljavas nas mãos, com suas forças e seus dons, combatendo os conquistadores ibéricos, na época da colonização. Trata-se, pois, de uma lenda, de uma alegoria, de um presságio ou de uma profecia? Será que as amazonas do passado traduzem bem as lutas das mulheres amazônidas do presente?
De qualquer maneira, suas vozes hoje são clamores proféticos. E o que ficou, de registro, das presenças substanciosas das mulheres no Sínodo? No Documento Final do Sínodo, as suas vozes foram registradas, sobretudo nos números 97 a 103. E na Exortação Apostólica Pós-Sinodal Querida Amazônia, suas vozes também foram registradas, sejam nos sonhos das mulheres, sejam nos sonhos do papa Francisco sobre as mulheres, nos números 99 a 103. Interessante que os números quase coincidem nos dois Documentos.
Esta é minha convicção pessoal, sem necessidade nenhuma de comprovação científica: quem quiser lutar pela vida tem que ter as mulheres como aliadas. Elas entendem mais de vida do que os homens. Elas existencialmente sentem e sofrem as dores da vida nos seus próprios corpos. A nossa maior dor é ver a matança de quem mais entende de vida. Os altos índices de feminicídios estão aí para comprovar. Neste contexto, os “problemas” passam a ser mais os homens e não mais as mulheres.
Nos piores momentos da vida de Ester, como rainha, o rei Mardoqueu disse-lhe: “quem sabe se por isto mesmo chegaste à realeza, para que em tal situação estivesses pronta para agir?” (Est 4,14b). Quem sabe se nas crises, pelas quais passamos, as vozes das mulheres não precisam ser mais ouvidas?
Termino, parafraseando as sábias palavras de Francisco: “o problema da Igreja na Amazônia não são as mulheres!”