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Márcia Maria de Oliveira
UFRR; Assessora da Repam

 

Os discursos equivocados do novo cenário político brasileiro sobre a questão indígena ressuscitaram o projeto integracionista, que parecia ter sido superado em meados do século passado. O integracionismo  representa o que há de mais atrasado nas políticas indígenas e um atentado aos direitos dos Povos Indígenas reconhecidos nos tratados internacionais como a Convenção no 169 da Organização Internacional do Trabalho – OIT sobre Povos Indígenas e Tradicionais, adotada em Genebra, em 27 de junho de 1989, assinada e promulgada no Brasil pelo Decreto Presidencial nº 5.051 de 19 de abril de 2004.

O interesse capitalista nos recursos naturais das Terras Indígenas do Brasil, especialmente madeira, minérios e água, tem produzido debates anti-indigenistas que desqualificam esses povos milenares que resistem por mais de quinhentos anos de colonização. Somente por isso mereceriam todo o respeito e reconhecimento da sociedade.

Dentre tantas contribuições que os Povos Indígenas representam para toda sociedade, destaca-se a preservação das florestas resultante do modo de vida desses povos num sistema de inter-relação e interdependência com a natureza, elementos fundamentais da “Ecologia Integral” definida e defendido pelo Papa Francisco na sua Encíclica Laudato Sì (2015).

Além da dimensão ecológica e política do modo de vida, milenarmente assumido pelos Povos Indígenas, gostaria de retomar um debate de um texto de minha autoria, escrito para contribuir com o curso de Pedagogia – Licenciatura Intercultural Indígena da Universidade do Estado do Amazonas (UEA), (http://cursos3.uea.edu.br/docente.php?cursoId=87).  Trata-se do quinto capítulo da coletânea intitulada Sociologia da Educação: Sociedades indígenas e não indígenas. Publicada em parceria com Benedito José de Carvalho Filho, em Manaus, Editora UEA, Série Pedagogia Intercultural 3, em 2010.

Neste debate, se destacam as grandes contribuições que os Povos Indígenas representam para a produção da ciência moderna. Na Amazônia, eles são referências para a produção de fármacos e cosméticos, apropriados pelo grande mercado sem fazer-lhes referência em suas patentes. Sim, eles produzem muita ciência! Basta aprofundar seu etnoconhecimento, seus milenares etnossaberes e suas etnopráticas para reconhecer a sua ancestral elaboração na produção da etnociência. No Brasil, esses vocábulos ainda são pouco estudados, mas, são carregados de significados utilizados por muitos povos e organizações indígenas como instrumento político. Isso quer dizer que a utilização destes vocábulos insere um novo debate nas lutas políticas dos povos indígenas.

Em muitos contextos e realidades indígenas, estes conceitos já deixaram de ser apenas vocábulos e se converteram em temáticas ou disciplinas curriculares. É o caso da experiência da formação de professores indígenas da Universidade Indígena da

Venezuela – UIV, (http://www.causamerindia.galeon.com/pag/trabajos.htm#universidad), localizada às margens do Rio Tauca, no Município de Caicara, no Estado Bolívar da Venezuela. Nesta experiência de educação superior indígena, a produção do conhecimento já é vista pelos representantes das etnias Pemon, E’ñepa, Yek’wana, Piaroa, Pumé, Warao, Sanema  e Kariña, sob a ótica da etnociência.  Na UIV esses vocábulos orientam trabalhos de conclusão de curso dos alunos que dominam seus conceitos e os apresentam como novidade na produção de conhecimento na educação superior indígena.

Neste tempo de crises na Venezuela, a UIV tem se convertido em um espaço importante a serviço dos povos e comunidades indígenas da Amazônia venezuelana produzindo conhecimentos que contribuem para fundamentar a luta em defesa de seus territórios e na busca de modelos de autogestão. A sistematização destes conhecimentos se orienta pelo viés da etnociência e vem ganhando respeito e notoriedade pela qualidade da produção acadêmica ali desenvolvida.

Dada a sua relevância na atual conjuntura política brasileira, na próxima semana seguiremos aprofundando essa temática.

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