Notícia

Por REPAM-Brasil com informações de Luis Miguel Modino, comunicação CNBB Norte 1
Fotos: Cláudia Pereira 

Pacaraima, uma pequena cidade na fronteira com a Venezuela, antes era um local desconhecido até se tornar manchete dos jornais com o início da migração venezuelana. A cidade mudou o rosto, em dez anos sua população dobrou, e hoje 50% são venezuelanos. A cidade é o local onde a Igreja alarga sua tenda cada dia, se tornando casa de acolhida, mas ao mesmo tempo, lugar de diversas formas de exploração, com episódios que são exemplos claros das dificuldades enfrentadas pelos migrantes de diversos lugares do mundo.

Uma realidade de sofrimento e esperança

A missão que a Comissão Episcopal Especial para o Tráfico de Pessoas da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) está realizando em Roraima, com visitas à Guiana e a Venezuela, permite conhecer uma realidade que encerra muitas mazelas, situações de sofrimento que muitas vezes não aparecem, mas acontecem, provocando aflição em pessoas que carregam histórias de vidas feridas.

Na cidade, que é marcada pelas filas e por pessoas deambulando nas ruas, a acolhida é realizada pelo poder público, principalmente pelo exército brasileiro, organismos internacionais e diversas instituições, dentre elas a Igreja Católica. São diversos os espaços de acolhida, destinados a diversos públicos, dentre eles povos indígenas, mulheres com crianças, famílias, idosos e entre outros. O refúgio dos povos indígenas abriga cinco povos diferentes chegados da Venezuela, fugindo da fome, da violência, do garimpo e de muitas situações de violência. No Brasil, eles querem constituir comunidades indígenas, onde os diversos povos possam reconstruir suas vidas.

A Igreja que acompanha os migrantes

A Casa São José, abrigo para mulheres e crianças, foi criado em 2020 pelas Irmãs de São José de Chambery. As condições em que se encontravam as mulheres, que sofriam diversas formas de maus-tratos, exploração e tráfico de pessoas, levou as religiosas, sem nenhum recurso e ajuda, a iniciar uma verdadeira aventura. Aos poucos, as ajudas chegaram, primeiro da Operação Acolhida do governo brasileiro, que até hoje fornece alimentação, e depois de muitas pessoas, de diversos lugares do Brasil e do mundo, sensibilizadas com a invasão do abrigo em 2021. Um tempo de muito sacrifício e choro, como descreve a religiosa que coordena o espaço. A coordenação da Casa explica que, atualmente, a passagem é mais rápida, no máximo um mês, no início algumas mulheres ficavam até seis meses, porque não tinham aonde ir.

As irmãs de São José de Chambery também acompanham a primeira Associação de Migrantes Venezuelanos no Brasil no ramo da panificação, a Padaria São José, um sonho de ter pão em todas as mesas, de levar o pão às comunidades mais necessitadas, mais distantes de Pacaraima. Um sonho que foi iniciado no salão da paróquia e que depois de dois anos trabalham sete pessoas, e tem seu espaço de atendimento, ajudando os venezuelanos que cada dia entram pela fronteira. Criar essa associação não foi fácil, mas o apoio da diocese de Roraima fez possível sua legalização.

Outros dois projetos da Igreja Católica são o Projeto Porta Aberta, que tem capacidade para acolher até 50 pessoas que aguardam a interiorização no Brasil. A iniciativa oferece café da manhã, almoço e janta, e desde novembro de 2023, já acolheu mais de 120 famílias. Igualmente, o projeto com idosos, que durante o dia oferece diversas atividades para os idosos. Os dois projetos são coordenados pelo padre Jesus Fernández de Bobadilla.

Indiferença diante da migração e o tráfico de pessoas

Dessa missão participam o bispo de Picos (PI) e membro da comissão, dom Plinio José Luz da Silva, que, diante do tráfico dos seres humanos, denuncia: “a indiferença da sociedade, também da Igreja, em diversas regiões”. O bispo afirma que estamos diante de “algo que é escondido, mas que existe, e ele precisa ser considerado e combatido. Não dá nenhum impacto, o pessoal não quer discutir sobre esse determinado assunto, entrar nos fatos”.

Diante dessa realidade, “eu vejo a necessidade da divulgação para prevenir”. Do mesmo modo que outras realidades que tem a ver com os pobres e a injustiça social são debatidas pelas Pastorais Sociais, o bispo de Picos insiste na necessidade de divulgação, de que nos subsídios da CNBB para as diversas campanhas, seja contado a realidade, como acontece em Roraima, onde “as pessoas ficam vulneráveis diante da migração, as pessoas ficam desfavorecidas de todos os recursos”, o que faz com que as organizações criminosas encontrem a oportunidade para usar os migrantes como mercadoria.

Dom Plinio destaca a necessidade da Comissão conhecer a realidade para saber enfrentar os ataques à vida, essa chaga na vida das vítimas. Ele afirma que “esta missão, ela enriquece a gente com um conhecimento para que possa argumentar para a sociedade aquilo que a gente conhece”, o que demanda da comissão estar “permanentemente nessa investigação”, em vista de divulgar fatos nos meios de comunicação, o que ele considera fundamental, “as pessoas precisam tomar conhecimento do que está acontecendo e possam reconhecer em volta da realidade local, casos que são ocultos”.

Defender a vida sempre

Como Igreja, “nós precisamos defender a vida, desde a sua concepção até o fim último”, como missão da Igreja, segundo o bispo. Ele destaca que “essa vida, ela está realmente envolta na realidade”, afirmando que “o maior sofrimento do povo é gerado por uma sociedade da indiferença, da divisão de valores, da falta de oportunidades de viver dignamente, principalmente os mais pobres, os mais vulneráveis, que são os primeiros a sentir esse impacto”. Ele denuncia iniciativas dentro da Igreja Católica que “praticamente excluem de sua missão essa parte de olhar a pessoa como um todo, na sua dignidade”.

O bispo enfatiza que “há situações em que só a gente falar na palavra pobre, já são discriminadas por grupos religiosos que fazem seu trabalho na parte intimista”, algo aparece na linguagem que leva as pessoas a pedir, “para mim, para minha família, não se abre espaço para a fraternidade, para a solidariedade”. Diante disso, ele considera a Campanha da Fraternidade como “um exemplo positivo de que a Igreja realmente se preocupa com a pessoa como um todo, principalmente nesse momento em que ela fica vulnerável em seus direitos, sua dignidade”.

Histórias de vida, de pessoas acompanhadas pela Igreja, que escuta de forma atenta para poder identificar as dores, as violências, que ajuda os migrantes a conhecer seus direitos e as ameaças. Migrantes que na fronteira entre o Brasil e a Venezuela, muitos deles em condições muito precárias, em ocupações, muitas vezes lideradas por mulheres, que reconhecem e agradecem o apoio da Igreja Católica.

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