A formação daqueles que um dia serão os presbíteros da Amazônia foi uma das reflexões presentes no Sínodo para a Amazônia. As conclusões foram recolhidas no Documento Final do Sínodo e na Querida Amazônia, que está completando dois anos de sua publicação.
O padre Zenildo Lima, reitor do Seminário São José de Manaus, foi um dos auditores na Assembleia Sinodal. Ele reflete sobre os encaminhamentos realizados, reconhecendo que “foi um pouco freado por esse contexto de pandemia”. Mesmo assim, está sendo oportunidade para “uma tomada de consciência da necessidade real de uma verdadeira reformulação dos caminhos, nos itinerários, dos processos pedagógicos, na formação presbiteral”.
Conhecer as reflexões do Sínodo e dos documentos conclusivos, onde são confirmadas as intuições já presentes anteriormente no Seminário São José de Manaus, “se torna agora uma condição necessária aqui no nosso seminário para um jovem candidato ao ministério presbiteral para servir às igrejas da Amazônia”. Daí a importância de iniciativas que vão surgindo no Seminário São José, como o Núcleo de Reflexão Pluriétnica, “expressão de tentativas de mudanças, e o que é bonito, a partir dos seminaristas, a partir de dentro”.
O padre Zenildo defende uma necessária conversão eclesial e uma revisão da ministerialidade, que ajuda em uma maior presença da Igreja nas comunidades. Um processo que está ajudando na reformulação da formação dos seminaristas, a “repensar o ministério presbiteral”, insistindo em “um ministério que é capaz de trabalhar com o ministério das mulheres”. Tudo isso gera confiança a ajuda “nesse caminho que nós vamos fazendo como Igreja da Amazônia”.
Uma das reflexões do Sínodo para a Amazônia, que recolhe o Documento Final e a Querida Amazônia, que está completando dois anos da sua publicação, é a formação dos futuros sacerdotes. Como isso está se concretizando depois de dois anos?
Para a gente falar de encaminhamentos ou de concretização de indicações o de pistas da Querida Amazônia, a gente pode abordar a partir de duas perspectivas, uma de um desdobramento mais prático, mais concreto, que foi um pouco freado por esse contexto de pandemia. Sobretudo no que diz respeito a articulações ou demandas pastorais que implicavam mais mobilidade da Igreja. Outra diz respeito a atualização de compreensões.
Nesse campo da formação presbiteral, a grande contribuição, e isso a gente pode falar de um grande desdobramento nos processos de formação presbiteral das igrejas da Amazônia, diz respeito a uma tomada de consciência da necessidade real de uma verdadeira reformulação dos caminhos, nos itinerários, dos processos pedagógicos, na formação presbiteral.
Não tenho informação que algum seminário tenha dado passos concretos nesse sentido, senão a própria CEAMA, que tem iniciado um processo, inclusive neste mês de fevereiro haverá um encontro sobre isso, que quer discutir novos caminhos para a formação presbiteral a luz do Sínodo, do Documento Final e da Querida Amazônia.
Inclusive, aqui no Seminário São José de Manaus, onde se formam os seminaristas das 9 igrejas que fazem parte do Regional Norte 1 da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), uma iniciativa que surgiu no último ano foi o Núcleo de Reflexão Pluriétnica. Qual a leitura que pode ser feita disso?
Concretamente no nosso Seminário Arquidiocesano São José, que é um seminário da Arquidiocese, um seminário da província, um seminário do Regional em certo modo, primeiramente o Sínodo, ele trouxe a confirmação e lucidez do que nós tínhamos como intuições aqui na casa, aqui no seminário.
Se a gente pode falar de desdobramento, além do estudo, se torna agora uma condição necessária aqui no nosso seminário para um jovem candidato ao ministério presbiteral para servir às igrejas da Amazônia, ele tem que passar por um contato com as reflexões do Sínodo e as indicações dos documentos conclusivos, Documento Final e Querida Amazônia.
Um segundo elemento, a concepção de como se pensa a totalidade do processo de formação no Seminário São José de Manaus, é perpassada por essas perspectivas da Querida Amazônia, e concretamente dos seus sonhos. Quer dizer, se tem em vista que o presbítero egresso do Seminário de Manaus, alguém com esta capacidade de envolvimento com as grandes questões que desafiam a vida dos pobres, o sonho social; que tem a capacidade de dialogar com as emergências culturais e teológicas das populações amazônicas, o sonho cultural; despir-se de um modelo litúrgico mais centro-europeu para um modelo mais inculturado, a necessidade de compreender que o ministério tem que ser evidenciado dentro de uma nova dinâmica eclesial que não pode ser marcada pelo clericalismo, o sonho eclesial; e necessariamente, a pastoral de um presbítero formado na Amazônia tem que considerar a grande tarefa que é o cuidado da Casa Comum, o sonho ecológico.
Nós temos um novo norteamento mais lúcido para as dinâmicas do Seminário. Aí iniciativas mais concretas evidenciam esses elementos, como esse Núcleo de Reflexão Pluriétnica, num seminário que já tem 9 etnias, nos ajuda em certo modo a colocar em prática as reflexões, seja do ponto de vista do sonho social, seja do ponto de vista do sonho cultural. A compreensão das dinâmicas da fé, a partir também da experiência religiosa das populações indígenas, no caso das etnias presentes aqui no Seminário.
Tudo percebe que nesse Núcleo de Reflexão, que está engatinhando, está nos seus primeiros passos, tenhamos uma nova resposta muito concreta de uma nova vertente no Seminário. Não é só uma atividade, uma nova aditividade dentro do mesmo Seminário, senão correria o risco de ser vinho novo em odres velhos. Mas já é expressão de tentativas de mudanças, e o que é bonito, a partir dos seminaristas, a partir de dentro.
Uma das reflexões que surgiram no Sínodo foi passar de uma Igreja de visita, aquilo que tradicionalmente foi feito pelos padres na Igreja da Amazônia, para uma Igreja de presença. Como incentivar isso naqueles que estão se formando para serem os padres da Igreja da Amazônia nos próximos anos e décadas?
Isso passa muito aproximadamente da questão da dimensão pastoral, da dimensão missionária da formação presbiteral. Os estudantes das dioceses e prelazias do interior do Estado do Amazonas e Roraima, que vem de comunidades indígenas, ribeirinhas, passam boa parte do tempo do processo formativo na grande metrópole, Manaus, com possibilidade de experiências pastorais em paróquias da capital, algumas delas profundamente marcadas pelo elemento urbano, e algumas delas profundamente engessadas por modelos mais centralizadores.
Nós temos priorizado no Seminário as experiências pastorais que exigem dos seminaristas mais mobilidade. Experiências pastorais nas comunidades de periferia, ribeirinhas. Uma outra ferramenta muito útil nesse sentido, que também parte dos seminaristas é o Conselho Missionário de Seminaristas, o COMISE, que realiza as semanas missionárias. Vai moldando o perfil do presbítero que a gente quer para um presbítero em saída.
É claro que esta passagem, que é uma reflexão, quase se dá um chavão, da pastoral de visita para a pastoral de presença, é um passo muito longo. Porque nós vamos continuar sempre com essa dinâmica de visitas pastorais, das itinerâncias, enquanto a gente não consegue manter uma presença mais fixa de Igreja. Mas essas visitas não dependem só de mudar a estratégia pastoral, dependem da conversão eclesial, e consequentemente de uma revisão da ministerialidade.
Enquanto tudo está concentrado no ministério presbiteral vai ser necessário que esse ministério mais escasso, marque presença visitando comunidades. Quando a gente faz uma revolução ministerial na Igreja, é mais fácil assegurar a presença de outros ministérios nas comunidades eclesiais.
Quais as perspectivas para avançar nessa concretização das propostas do Sínodo para a Amazônia na formação dos futuros presbíteros?
Particularmente, no nosso Seminário São José estamos fazendo um processo muito interessante de reconstrução do projeto pedagógico. Já tínhamos iniciado uma reflexão que depois, não digo que se tornou obsoleta, mas que foi completamente enriquecida e repensada com as indicações do Sínodo da Amazônia. Depois o fato de mantermos sempre aproximação do Seminário diocesano com a caminhada da Igreja da região. O seminário antenado com as assembleias do Regional, com as perspectivas dos encontros do episcopado, mas sobretudo com o que está acontecendo nas assembleias diocesanas das igrejas particulares.
Esse elemento ajuda muito a pensar essas dinâmicas que podem combinar com o que o Papa chama sonho eclesial, e o Documento Final, na verdade chama a atenção para uma conversão. E aqui vale a pena a gente destacar a necessidade de repensar o ministério presbiteral, por tanto o ministério do egresso do Seminário São Jose, dentro dessa dinâmica, disse agora há pouco, da ministerialidade. E aqui chamo a atenção de um ministério que é capaz de trabalhar com o ministério das mulheres. Não dá para pensar o seminário e o ministério presbiteral sem pensar o conjunto da ministerialidade, e sem pensar a participação das mulheres nesse aspecto também. Nós no Seminário São José estamos muito abertos e muito confiantes nessa experiência, nesse caminho que nós vamos fazendo como Igreja da Amazônia.
Luis Miguel Modino/Comunicação CNBB Norte 1