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Por Rosa M. Martins, Comunicação REPAM-Brasil 

“Quando o garimpo ilegal chega ao território indígena, não vem sozinho, é uma rede complexa de ações que afetam de forma fatal a vida dos povos originários do ponto de vista cultural, social e espiritual, gerando conflitos entre as famílias e desestruturando seu modo de vida: álcool, droga, prostituição, exploração da terra, abuso sexual das meninas,  invasão das plantações dos indígenas, pesca, caça”,  conta a liderança católica, Gilmara Fernandes, Membro do Conselho Indigenista Missionário (CIMI), de Roraima.

Ainda, segundo Fernandes, uma série de erros, negligências e corrupções tem impedido a União e o Estado de prestar a devida atenção e atendimento aos Yanomami. O que foi mostrado pela Imprensa nos últimos dias é somente a ponta do iceberg. “A invasão maciça de garimpeiros, falta de equipes médicas e de medicamentos, que levaram à crise humanitária que presenciamos, vinham sendo denunciadas há anos por lideranças indígenas, mas ignoradas pelo ex-presidente Jair Bolsonaro”, assegura.

A indígena Jama Wapichana, membro do Movimento Indígena e da Articulação das Pastorais Sociais e Comitê Local da REPAM, em Roraima, afirma que “a tragédia já estava anunciada, pois há muito tempo nossos parentes estão vivendo sem direito à vida, à dignidade.  O Estado tem que se responsabilizar por sua negligência e esse prejuízo causado aos povos”, afirma.

Os cerca de 20 mil garimpeiros que atuam nas terras indígenas Yanomami, que compreende mais ou menos um milhão de hectares, tiveram seu auge, segundo afirmam fontes oficiais, por meio do incentivo e promoção do governo anterior, de 2019 a 2022.

A atuação da Igreja

Desde os primeiros anos da década de 70, a Igreja de Roraima, por meio de missionários e missionárias, os movimentos e as organizações não governamentais têm trabalhado arduamente na defesa dos povos originários e da natureza. Para a professora Márcia Maria de Oliveira, da Universidade Federal de Roraima, a Igreja tem exercido um protagonismo discreto, por meio da formação de lideranças, campanhas denunciativas, no confronto direto com as autoridades políticas. Ela aponta que a missão encontra desafios reais que dificultam o atendimento preciso e eficaz aos povos originários.  “Desde a manutenção financeira da missão que é altíssima, até os sacrifícios inimagináveis de chegar à missão à pé com caminhada de 5 dias pelos rios e pelas florestas ou pagando quantias exorbitantes ao redor de 10 mil reais por transporte de cada pessoa até a missão Catrimani.”

Oliveira acena para o importante papel  da Igreja junto a estes povos ao ressaltar que “ela acompanhou toda a luta pela demarcação da Terra Indígena Yanomami e tem se colocado a seu lado de forma incondicional. Quando houve o genocídio, em meados de 1993, na comunidade de Haximú, foram as religiosas missionárias que denunciaram às autoridades.”

Ainda, de acordo com a professora Márcia, a Igreja é presença marcante nas mobilizações do Povo Yanomami, nos espaços de debate nacionais e internacionais, e muitas religiosas e muitos religiosos atuam como enfermeiros/as e educadores/as populares, levando alívio e trocando conhecimentos na missão. “O problema é que as distâncias não permitem um acompanhamento mais amplo e muitas comunidades distantes encurraladas pelos garimpos estão sem nenhuma atenção por parte da Igreja por dificuldade de acesso e por escassez de missionários e missionárias”, explica.

Há 250 km de Boa Vista, atuam na missão Catrimani, desde 1965, os missionários da Consolata, os quais têm contribuído assiduamente na defesa dos direitos dos povos e da natureza, enviados para atuar em tempo integral junto aos Yanomami. Irmão Carlo Zacquini, missionário italiano, há 57 anos em Catrimani, relata que “tanto a Igreja de Roraima, quanto a Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) sempre denunciaram e tentaram sensibilizar a opinião pública, mas, os órgãos públicos sempre alegaram dificuldades ou falta de recursos”.

Em 2019, o então bispo de Roraima, Dom Mário Antônio da Silva, em carta de despedida da diocese, denunciou rigorosamente o garimpo ilegal. “O garimpo dentro das terras indígenas é uma atividade ilegal que não pode ser acobertada. Ela traz violência contra as pessoas, comunidades inteiras, sem falar dos grandes estragos à Casa Comum, ferindo a terra, destruindo a floresta e contaminando a água que nos dá a vida (…) quem está por trás do garimpo? Quem é que verdadeiramente se enriquece com a depredação, a contaminação e a violência? Quem está mais interessado na mineração dentro das terras indígenas?”, questiona em um trecho da mensagem. (Veja íntegra da carta).

Em nota, REPAM-Brasil pede fim do garimpo ilegal

A Rede Eclesial Pan-Amazônica, que desde a sua fundação, em 2014, cumpre a missão de defender os direitos dos povos e da natureza na Amazônia, diante das últimas reportagens sobre a situação dos Yanomami, divulgou, nesta segunda-feira, 23 de janeiro, uma nota na qual condena veementemente o descaso e o desamparo do governo anterior e pede ação rápida e eficiente do Governo Federal, entre outras solicitações “a suspensão imediata do garimpo ilegal nos territórios indígenas, em especial, na Terra Indígena Yanomami, e a responsabilização dos políticos e das grandes empresas que promovem o garimpo ilegal que destruíram os territórios e levaram centenas de Yanomami à situação de desnutrição, doenças graves e morte. Leia a íntegra da nota.

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